A 6ª turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1ª) confirmou uma decisão de primeiro grau que permitiu que uma médica veterinária revertesse sua reprovação em um concurso público na cidade de Santa Izabel do Pará, na região metropolitana da capital paraense, Belém. Na época do certame, ela passou em primeiro lugar e deveria, como parte dos exames de admissão, fazer um raio-x. Como estava grávida, ela pediu à banca que postergasse a apresentação do exame, mas seu requerimento foi negado e ela foi desclassificada.
Ela precisou impetrar um mandado de segurança para voltar ao pódio do concurso. A decisão liminar (dada no começo do processo) e a sentença foram todos favoráveis à veterinária, que estava com 13 semanas de gestação na época. O acórdão do TRF-1, publicado no início de junho, chancelou o entendimento fixado em 1º grau.
Os direitos que comumente são atribuídos às gestantes na verdade são proteções que a lei estabelece em favor do bebê, para que ele possa se desenvolver em condições adequadas. Tanto os regimes de trabalho na iniciativa privada quanto no setor público devem respeitar as normas trabalhistas que defendem os direitos dessa criança que irá nascer, sem que, com isso, a mãe seja prejudicada – como aconteceu no caso da médica veterinária de Santa Izabel do Pará.
Para compreender alguns detalhes sobre os direitos trabalhistas das mulheres gestantes, a reportagem do Estadão conversou com a advogada trabalhista Ana Karina Borin, secretária adjunta da Comissão de Advocacia Trabalhista da OAB São Paulo.
ESTADÃO: Se uma funcionária engravidar, ela pode recusar as tarefas que antes fazia por serem nocivas à gestação?
ANA KARINA BORIN: Desde que a gestação seja comprovada, ou seja, desde que haja confirmação da gravidez (o que pode ocorrer mediante atestado médico ou exame laboratorial), a mulher grávida tem o direito de romper compromissos do contrato de trabalho que sejam prejudiciais à sua gestação e deve ser afastada de atividades insalubres e penosas durante a gestação e até mesmo, no caso de insalubridade, durante a lactação.
ESTADÃO: O que fazer diante de uma ameaça de demissão?
ANA KARINA BORIN: A Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) prevê, em seu artigo 391, que a mulher estar grávida não constitui justo motivo para a rescisão do contrato de trabalho. Essa disposição visa evitar dispensas discriminatórias e proteger o nascituro. Para garantir que a trabalhadora gestante não seja dispensada, esse artigo prevê estabilidade desde a confirmação da gravidez até 5 meses após o parto. Assim, se houver ameaça de dispensa tanto pelo estado gravídico ou pela recusa de afastar a gestante de trabalho insalubre ou penoso, nos termos das normas trabalhistas, é preciso procurar um advogado para que sejam adotadas medidas judiciais.
ESTADÃO: Uma empresa pode deixar de contratar uma mulher unicamente pelo fato de ela estar gestante? Como comprovar que houve discriminação?
ANA KARINA BORIN: A legislação trabalhista brasileira veda a dispensa discriminatória da mulher gestante. Nos casos judiciais, são admitidas provas documentais (e-mails, ata notarial de conversas por WhatsApp) ou mesmo testemunhais (pessoas que tenham presenciado a discriminação). Em alguns casos, gravações de conversa também são aceitas.
ESTADÃO: Existe alguma possibilidade legal de prorrogação da licença-maternidade?
ANA KARINA BORIN: Em 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a prorrogação do salário-maternidade caso, em decorrência de complicações médicas relacionadas ao parto, haja necessidade de internação da mãe ou do recém-nascido. Essa decisão originou a Portaria nº 28/2021 do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
ESTADÃO: Durante o período de licença-maternidade, quais são os benefícios de que a gestante usufrui? A empresa deve continuar pagando vale-alimentação e vale-transporte?
ANA KARINA BORIN: Durante a licença-maternidade o contrato de trabalho é interrompido. Isso significa que a empresa paga o salário-maternidade da trabalhadora e deverá compensar esses valores quando fizer os seus recolhimentos previdenciários. FGTS e INSS têm que ser pagos normalmente. Já o vale-alimentação e o vale-transporte não são devidos em razão do afastamento das atividades, mas o convênio médico será mantido. Contudo, alguns empregadores mantêm o auxílio-alimentação por liberalidade.
Fonte: Estadão