Além de ser a data em que se comemora o Dia Mundial do Trabalho, este 1º de maio de 2023 também marca o aniversário de 80 anos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o conjunto de leis que regulamenta as relações trabalhistas. Mas o texto (Decreto-Lei 5.452), assinado por Getúlio Vargas em 1943, já não é mais o mesmo, pois precisou passar por uma série de adequações ao longo destas oito décadas para acompanhar mudanças surgidas nas relações entre empregadores e empregados.
Por isso, a CLT ainda é considerada uma jovem senhora que, na medida do possível, tem acompanhado as evoluções do mercado de trabalho.
A CLT inseriu na legislação brasileira uma série de direitos trabalhistas, regulamentando jornadas e condições de trabalho, remuneração, horas extras e benefícios como descanso semanal, férias, licença-maternidade e previdência social.
As maiores mudanças ocorreram com a reforma trabalhista de 2017, quando mais de 100 artigos foram alterados, além da inclusão de duas novas modalidades de contratação: o trabalho intermitente (por jornada ou hora de serviço), que não teve um bom nível de adesão, e o teletrabalho (trabalho à distância), que foi mais popularizado com o home office, após a chegada da pandemia da Covid-19.
“A legislação sempre vai andar um passo atrás da realidade. Mas, como um direcionamento, a CLT ainda atende bem as demandas”, avalia o advogado trabalhista Edson Veras. Ele acredita que as mudanças na reforma trabalhista, que contemplaram novas modalidades de trabalho, foram importantes para atualização. Além disso, Veras ressalta que a legislação ainda permite que as decisões tomadas em convenções coletivas prevaleçam em alguns casos. “O negociado prevalece sobre o legislado, o que dá mais flexibilidade”, destaca.
Mas, de qualquer forma, a CLT continua sendo uma base importante e sólida, sobre a qual podem ser construídos novos direitos ou incluídas novas categorias de trabalhadores. O advogado lembra que outro grande avanço foi a extensão dos direitos contidos na legislação para os trabalhadores domésticos, em 2015.
“Em 2017, quando ninguém esperava uma pandemia, já foi incluída a modalidade de teletrabalho, que é uma forte realidade hoje. Ela tem evoluído não apenas em direitos, mas também em novos processos, mais compatíveis com o momento”, destaca.
Isso significa que a legislação vai acolhendo novas circunstâncias, sem travar em relação a garantias mínimas para os trabalhadores. “A CLT sempre será uma senhora moderna em busca de atualizações”, avalia Edson Veras. Se, no início dela, havia até a necessidade de um juiz classista nos julgamentos, por conta da desconfiança quanto à isenção nas decisões, hoje já se admite até que as próprias categorias se reúnam e negociem seus direitos.
“Antes, o banco de horas dependia de convenção coletiva da categoria. Hoje, nem precisa ser inscrito se for pago em até 30 dias. São evoluções que foram acontecendo”, diz.
Inclusão social
Ao criar a CLT, considerada um dos primeiros instrumentos de inclusão social do País, Getúlio Vargas queria atrair mais trabalhadores do campo para a cidade para fortalecer as fábricas e evitar lutas de classe, ao reduzir a insatisfação dos operários com patrões e o próprio governo, o que provocava instabilidade política e econômica.
Para o professor da Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e Ciências Econômicas da UFG, especialista em Mercado de Trabalho, Sandro Monsueto, sem a CLT tudo seria bem mais difícil, pois ela surgiu num momento em que a relação trabalhista era muito desigual.
“Ela foi criada para tentar regular este mercado, que era muito assimétrico, inclusive com o trabalho infantil e jornadas excessivas”, lembra.Mas, por já ter 80 anos, o professor acredita que a legislação trabalhista sempre pode ser modernizada em alguns pontos, como qualquer outra.
“Precisamos reconhecer que, assim como os trabalhadores precisam ter seus direitos garantidos, há casos de empresas que também são prejudicadas por empregados mal intencionados, o que afeta a produtividade dos negócios”, explica.
Segundo Monsueto, os juristas devem identificar as mudanças necessárias para garantir um maior equilíbrio nesta relação. Para ele, a modernização é importante, desde que não provoque a volta da antiga assimetria nas relações trabalhistas.
“Mas pode-se simplificar a quantidade de leis que as empresas precisam atender, o que representa um custo muito alto para muitos negócios”, alerta o professor.
Todavia, para ele, a legislação é essencial para evitar e penalizar práticas criminosas como os trabalhos escravo ou infantil. “O trabalhador conquistou direitos e renda para que seu filhos pudessem ir para a escola ao invés de precisarem trabalhar”, completa.
Na visão do advogado trabalhista Murilo Chaves, os 80 anos da CLT foram marcados por uma evolução à proteção dos trabalhadores, mas também dos direitos das empresas, com a imposição de deveres para as duas partes. “Saímos de 1943 com pouquíssimas leis trabalhistas e viemos para uma consolidação de leis, um código trabalhista específico que contemplava todos os pontos necessários”, avalia.
Ele acredita que a legislação trabalhista ainda tenha muito a evoluir, mas que, mesmo assim, pode ser considerada moderna. O problema é que a sociedade atual vive um momento de rápida e surpreendente evolução tecnológica, que também atinge o mundo do trabalho. “Nem sempre a legislação consegue alcançar este nível de evolução”, destaca Chaves.
Mas outras atualizações já estão previstas para este ano, como as que devem contemplar trabalhadores por aplicativo ou a contratação de trabalhadores pessoa jurídica para cargos de direção.
Por isso, o advogado ressalta que as evoluções vêm acontecendo, na medida do possível, muito embora as relações sociais evoluam bem mais rápido que as trabalhistas. “A necessidade de atualização é constante. Se a gente reformar a CLT hoje, daqui a 30 dias já podemos ter coisas novas que precisarão ser alteradas. Mas ela ainda é uma legislação muito boa e temos motivos para comemorar”, destaca.
Ele alerta, no entanto, para a necessidade dos trabalhadores estarem sempre atentos quanto ao risco de mudanças que possam trazer prejuízos aos direitos conquistados.
Fonte: O Popular