As demissões por justa causa — penalidade máxima no contrato de trabalho sem direito à multa — cresceram no Brasil e bateram recorde em janeiro com 39.511 casos, o maior número em uma década, segundo um levantamento da LCA Consultores.
São cerca de 2,09% dos 1.887.422 desligamentos totais no mês, uma porcentagem consideravelmente superior aos 1,77% em dezembro de 2023. Em fevereiro, a margem das demissões por justa causa diminuiu, mesmo com um aumento dos desligamentos totais, para cerca de 1,942 milhão.
Uma circunstância similar já tinha sido observada em janeiro de 2014, quando 2,12% das demissões ocorreram por justa causa.
Uma década depois, especialistas avaliam que o cenário do mercado de trabalho está se transformando, com um aumento das demissões em massa no ano passado e uma mudança na perspectiva dos trabalhadores.
Para o especialista em carreiras, desenvolvimento humano e liderança Ronan Mairesse, o fator comportamental é a principal causa desse movimento.
“Após a pandemia ocorreu um esfriamento nas relações humanas devido à distância e, principalmente, a uma ansiedade acompanhada de irritabilidade que aflorou no comportamento dos profissionais”, disse ele.
O especialista avalia que houve um aumento da insubordinação, desrespeito a pessoas e processos, discussões com colegas e até vídeos com falas e desabafos contra as empresas, fatores que levam a demissões por justa causa.
Há 10 anos, as práticas dos profissionais causaram um cenário semelhante, segundo Mairesse. “Não tivemos um fator agravante como a pandemia, por exemplo, mas existia um clima político no Brasil que contribuiu para aflorar os ânimos”, disse ele.
Alessandra Souza Menezes, membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/SP, explica em quais situações a demissão por justa causa pode acontecer:
Furto ou desvio de dinheiro;
Formas de assédio, molestamento, atitudes grosseiras ou inadequadas à política da empresa;
Negociações no ambiente de trabalho que atrapalhem o rendimento do empregado — como um(a) vendedor(a) de produtos — ou externa ao ambiente de trabalho caracterizado por atos de concorrência;
Condenação criminal julgada;
Baixo rendimento, excesso de faltas, atraso, falta de empenho e outras ações similares;
Embriaguez habitual ou em serviço, quando não entendida como doença;
Violação de segredo na empresa;
Indisciplina ou insubordinação;
Abandono do emprego com faltas injustificadas durante 30 dias consecutivos.
Ronan Mairesse atribui o aumento das demissões a uma falta de produtividade ou compromisso das pessoas na empresa, que se encontram “mais sensíveis emocionalmente”, e acabam por trocar de emprego mais frequentemente.
É nesse cenário que o termo “quite quitting” surgiu e tem estado em alta nas rodas de conversa sobre o mercado de trabalho.
Trata-se de uma “demissão silenciosa” ou “renúncia silenciosa”, à medida que o trabalhador se restringe a fazer suas atividades sem propor mais do que se espera.
Esse movimento costuma ser relacionado à geração Z, pessoas nascidas entre 1996 e 2010 e que, geralmente, possuem outra perspectiva sobre trabalho e qualidade de vida.
Ainda segundo o especialista, a expectativa é que o índice de demissões por justa causa tenha uma queda até novembro e volte a subir no período de dezembro a janeiro.
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